A Natal virtual – Tribuna do Norte
Vicente Serejo
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Danilo Sá (Interino)
Que Natal tem grandes virtudes, não se pode duvidar. Um mar bonito, um rio manso, uma reserva de mata atlântica que se estira numa cadeia de vinte e oito morros que Eloy de Souza, num artigo, chamou de morros orientais do Tirol. É noiva do sol, como a viu Câmara Cascudo, nos seus trezentos dias de sol por ano, alisada pela brisa leve que adeja sob um céu sempre azul, guardando seu jeito de aldeia que se derrama em um vale branco entre coqueiros, como cantou o poeta Itajubá.
Na sua geografia física e humana, só perde para a cidade virtual que os nossos candidatos a prefeito constroem nos delírios eleitoreiros. Uma Natal virtual – toda saneada, com água fresca e encanada jorrando das torneiras de todas as casas. Bons hospitais, unidades de saúde como nas melhores cidades do mundo; muitas creches e escolas para todas as crianças e alunos, sem falar num sistema de transporte coletivo de fazer inveja, e um aparelho de segurança de primeiro mundo.
Quando vejo os programas da propaganda eleitoral fico desejando viver mais uns cem anos para viver e morar na cidade que a retórica demagógica vai construindo todas as noites, afinal nós merecemos, depois de mais de quatrocentos anos de esperança incansável e pressurosa. A Natal dos sonhos, reconheçamos, se não é proibido sonhar. E então seremos finalmente felizes, se para tanto um dia fomos feitos, longe, bem longe, do velho pessimismo de alguns mais recalcitrantes.
Basta dizer, verdadeiras as promessas, que seremos governados por democratas de raiz, intolerantes com as omissões terríveis dos que manejam, remanejam e giram as chaves dos seus cofres. Pelo visto e ouvido, nenhum dos direitos legais nos será negado. Principalmente aqueles garantidos pela Constituição, como saúde, educação e segurança. Não faltarão médicos e remédios, boas escolas e bons professores, policiais nas ruas garantindo o saudável direito de paz para todos.
E, nesse sonho, diga-se, não é justo que não façamos a nossa parte, aquilo que nos cabe e exige a consciência da solidariedade cidadã. Acreditemos, pois. Não custa nada. Se possível, façamos a corrente de homens e mulheres otimistas nesta vila tão bonita, cercada por um mar, um rio e uns morros, traços permanentes de sua fisionomia há quatro séculos. Desde quando partimos da estrela de pedra e cal da Fortaleza dos Reis Magos, com o ouro, o incenso e a mirra da esperança.
Depois, convenhamos, não custa nada, e se já esperamos tanto tempo, aguardar mais alguns meses. Falta pouco. Até lá, os nossos candidatos a alcaides já estarão roucos de tanta promessa e calarão. Falta pouco para o silêncio das câmaras e microfones, e as luzes da ribalta apagarem e que a cada quatro anos nos ofuscam. Mais uns dias mirrados, só mais alguns, e eles desaparecerão. Tomarão seus destinos e deixarão, por certo, nesse chão pisado, a nossa velha solidão de órfãos.
PALCO
GATO – Avisa-se a quem interessar: tem gato na tuba na prestação de contas dos conselhos que financiam projetos culturais na Capitania das Artes. A interina até teme assinar o que não conhece.
ALIÁS – Se o Ministério Público enfiar os olhos nas leis de incentivo e nas tão gordas e sombrias prestações de contas de altos valores dado a título de incentivo cultural, pode descobrir muita coisa.
ATRITO – Pode ser menos pacífica do que se pensa a saída de um grupo de tucanos dos quadros do PSDB local. Se o comando nacional não liberar, o caso pode acabar na justiça, por insatisfação.
IDIOTIA – Certeiro Muniz Sodré, professor emérito de comunicação, no título de sua análise: “Marçal reforça idiotia como rota para o poder”. Brilhar entre pares precários nunca foi tão fácil.
GESTO – O publicitário Alexandre Macedo autografou 248 exemplares do seu livro e a renda, no valor de R$ 19.8 mil, integralmente doada à Liga contra o Câncer, instituição sem fins lucrativos.
HUMOR – De um gaiato, via e-mail: “A nossa poesia feminina vive a mesma crise do marketing eleitoral da campanha. Com raras e valiosas exceções, já enfrenta hoje a depressão do puerpério”.
POESIA – Do poeta Eucanaã Ferraz, no seu novo livro “Sob a luz feroz do teu rosto”, a libertar do medo: “Amar um leão usa-se pouco, / porque não pode afagá-lo / o nosso desejo de afagá-lo”.
TRISTE – De Nino, o filósofo melancólico do Beco da Lama, entre irônico e mordaz: “Nada é tão decadente como a nossa poesia erótica feminina. Versos cansados, ardendo no vinagre da mesmice”.
CAMARIM
IMPASSE – A inadequação, em qualidade, da jazida de onde seria retirada a areia para a engorda de Ponta Magra pode levar o início da obra ser adiado outra vez. Agora por iniciativa da equipe técnica da Funpec já preocupada, inclusive, com os efeitos futuros nas praias do litoral de Natal.
IMPACTO – A precariedade vem do licenciamento que antes não cumpriu a exigência técnica e legal de estudos do impacto a ser causado. Se a chamada Área Dois não apresenta características minerais corretas, a escolha da jazida terá que ser mudada, sob pena da prática de crime ambiental.
SILÊNCIO – Ninguém sabe, e depois de tantos atritos, a posição da Procuradoria Geral do Estado. Se os procuradores da área ambiental são livres para uma atuação objetiva, em busca de uma saída rápida, ou se são prisioneiros do velho vício do reformismo comunista sempre a serviço do poder.
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