Diagramas – Tribuna do Norte
Dácio Galvão
Mestre em Literatura Comparada, doutor em Literatura e Memória Cultural/UFRN e diretor da Fundação Cultural Helio Galvão
Ailton Krenak revelou numa fala-texto o nome da égua do seu irmão de sangue: “Natureza”. Quem monta égua sabe da gostosura. É sedutor equitar bestas. Particularmente as caracterizados na prosa de Clarice Lispector. De “vida secreta” onde soltas “se processam durante a noite”. Elegantes, percutem cascos no solo. E nas areias, diagramas articulados… expondo matizes em pelagens diversas. São distintas na cantoria de Elomar Figueira: éguas baias. Brancas. Pampas. Amarelas. Ou em lotes de potrancas a esmo nos galopes sem freios e cavalgadas estelares.
Criamos “Canoa” na beira da lagoa Guaraíras. Em ambiência campestre composta por ecossistema de floresta atlântica e de restinga. Pisando tabuleiros costeiros no desmedido derramar-se da cana. De pelagem tricolor -branca, vermelho e preto- originária de cavalos Alter. A raça espanhola Andaluza, cuja origem étnica vem de cavalos nativos da Península Ibérica, germânicos e berberes.
Linhagem da casta oriunda do garanhão “Favacho Único”. A lenda em progênie da raça mangalarga marchador resultado de seleção genética de tradicionais oligarquias rurais mineiras. Ela: poema multicor de orelhas atentas lanceoladas. Beleza plástica, esperta, mas de temperamento dócil.
Na Roma antiga se montava o “equus” ou “ekwos”. Termo do tronco linguístico indo-europeu. Surgiram -apontam estudiosos- no Oriente Médio. Em 3.300 antes da era cristã. Ancestrais do nosso equino. Quando visitamos no Pavilhão da Oca no Parque Ibirapuera-SP- a exposição “Guerreiros de Xi´an e os Tesouros da Cidade Proibida”em 2003 (escavadas na tumba do primeiro imperador da China) o impacto da curiosidade não foram as esculturas dos guerreiros em terracota do exército do imperador Qin Shi Huang Di- mas as estátuas equinas em tamanho natural.
Indicando posicionamento dos membros em tríplice apoio! Uma das patas no ar! Condição diagramática do cavalo de passeio. De andamento marchado. O conjunto cerâmico é recorte do acervo de mais de mil peças encontradas sob terras datadas em 200 a.C. O homem e o cavalo estabeleceram ciclos históricos: bélicos e lúdicos! Perpassando guerras, religiosidade e a arte.
Pinturas rupestres, mitologias…na ruptura e no ufanismo kitsch. Nas ilustrações Armando de Freitas o animal aparece estampado no livro “Uma luz inesperada” de José Saramago. Espraiadas no texto “…num berço, enrolado na manta, respirando cheiro forte dos cavalos”. Traço, cromo e infância. Sonho. O cantar do romanceiro Fabião das Queimadas -escravizado potiguar negociador de sua própria alforria- nomina cavalos nordestinos numa linguística identitária: “Zabelinha”, “Baé”, “Maravia”… Versos do romance “O Boi da Mão de Pau”. Longínquas representações desses animais aparecem (341 a.C.) em moedas cartaginesas. Nos pergaminhos com iluminuras no medievo. Na produção visual contemporânea. Amálgama de eternas alegorias.
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