Saiba a importância da ludoterapia para as crianças
Tádzio França
Repórter
Brincadeira é coisa séria quando se torna um elemento para beneficiar a saúde física e mental. É o princípio da ludoterapia, um processo terapêutico específico para crianças, que se baseia no brincar. Através dessa atividade, permite-se que a criança aprenda a expressar de forma lúdica o que a aflige, e chegar a resolução de problemas como desvios alimentares, dificuldade de aprendizagem, insônia, gagueira, agressividade, insegurança, timidez em excesso, entre outras questões que podem envolver os pequenos.
Os recursos lúdicos da ludoterapia permitem que a criança expresse seu mundo interno e seus conflitos emocionais. Segundo Thaís Araújo, nutricionista materno-infantil e ludoterapeuta, as crianças são ativas na aprendizagem e têm uma capacidade de comunicar questões emocionais brincando.
“Através desses recursos, podemos compreender a dinâmica psíquica da criança, compreendendo-a na sua totalidade, e não somente no sintoma que se apresenta para nós”, ressalta. Os jogos e brincadeira permitem que a criança libere a tensão, frustração, insegurança e até mesmo a agressividade, medo e a confusão, sem que ela perceba ter todos esses sentimentos guardados.
Nas sessões de ludoterapia os pequenos se expressam através de brinquedos e jogos como fantoches, jogos de tabuleiro, bonecos, casas de madeira, bonecas, corda, bola, massinhas de modelar, espadas, bexigas, fantasias, caixa de areia, tinta guache, entre outros, além da própria energia que os pequenos investem nas brincadeiras. “Todos esses recursos estão mais perto do inconsciente e da expressão da problemática psíquica da criança”, afirma Thaís.
A nutricionista exemplifica as qualidades da ludoterapia, falando de sua aplicação na área nutricional. “No caso da criança com dificuldade alimentar, existe uma dinâmica familiar e não só sintomática da criança. Então não existe o brinquedo certo ou errado. A criança é livre para escolher interpretação, intervenção e simbolização. Tudo que é vivenciado pela criança desde as memórias uterinas está guardado com ela”.
Thaís explica que a ludoterapia também a ajuda a entender onde a dinâmica familiar interfere nas queixas sobre alimentação. “Alimentação é vínculo, é relacionamento. Ela tanto interfere as nossas relações, como reflete a forma como nos relacionamos com a vida. Cada criança e família têm seu próprio tempo e engajamento. Inclusive muitas não suportam ou não estão prontos para o processo terapêutico”, afirma.
O papel dos pais no processo ludoterapêutico é fundamental e necessário. A nutricionista explica que a evolução nutricional também está relacionada à maneira como os pais se comportam dentro do contexto familiar. “Um dos nossos objetivos é fortalecer as habilidades dos pais para esse papel de cuidadores, para que eles aprendam a lidar com as necessidades específicas das crianças com restrições alimentares, por exemplo”, diz.
Ao participar do processo da ludoterapia, os pais se tornam mais seguros para guiar seus filhos na construção de uma alimentação mais adequada. Mostrar a existência de temperamentos alimentares que ajudam a entender cada criança, e evitar palavras que causam prejuízos emocionais no âmbito alimentar, como “ele não come”, “ele é difícil para comer”, “ele não tem fome”, “ ele come demais”, entre outras frases similares.
A ludoterapia também pode ser aplicada para crianças autistas. “Tudo pode e dever ser trabalhado no autismo. Especialmente para elas, a abordagem terapêutica inclui sensorialidade, corporeidade, criatividade e afeto. O foco não é o autismo, mas a criança. Antes de ser autista, ela é uma criança e seu conforto e saúde precisam ser levados em consideração”, afirma.
E não é só os pequenos que podem usufruir da ludoterapia. Segundo Thaís, adolescentes e até alguns adultos também podem entrar na brincadeira terapêutica. “Eu atendo adolescentes e adultos com questões alimentares. A ludoterapia também trabalha com projeções gráficas e eu uso muito essa técnica em associação com um psicólogo”, explica, ressaltando que os desenhos são interpretações gráficas similares aos brinquedos, uma forma de comunicação. “Todos estão perto do inconsciente da problemática da psiquê da criança”, completa.
A ludoterapia pode e deve ser combinada com outros métodos terapêuticos, segundo a nutricionista. “É de suma importância que a criança esteja em conjunto com o psicólogo e outros profissionais necessários para a evolução do tratamento. A equipe interdisciplinar traz benefícios para toda família”, enfatiza.
Brincar de sentir bem
As brincadeiras terapêuticas trouxeram a leveza que Renan, hoje com 10 anos, precisava para superar uma fase difícil de sua vida. Aos quatro anos o menino foi diagnosticado com epilepsia, e precisou passar por um processo de tratamentos que incluiu a alimentação, uma das etapas mais complicadas. “No começo foi preciso uma dieta muito rigorosa para obter o resultado necessário. Esse início foi pesado, mas ele foi crescendo e as necessidades foram mudando”, conta.
Vanessa conheceu a ludoterapia há três anos, e foi um respiro de alívio no cotidiano de Renan. “A terapia deixou o processo de educação alimentar mais leve e agradável para ele, que já tinha sete anos na época”, diz. A rigidez dos anos anteriores deram lugar a jogos, brincadeiras, e a uma conversa mais aberta e simpática com o garoto. “Ele finalmente ficou à vontade. O Renan brinca, aprende e se diverte, faz o que quer, fala do que gosta e sente. Essa linha integrativa foi perfeita para ele”, completa.
O processo terapêutico ajudou Renan a sair da medicação há três anos, controlando sua alergia e sensibilidade alimentar. “Atualmente ele está numa fase esportiva, só quer saber de futebol, e a gente trabalha isso dentro da ludoterapia, passando pra ele a ‘dieta do Cristiano Ronaldo’, e o que mais fizer ele se sentir à vontade”, diz. Os benefícios também incluem maior concentração, mais disposição para brincar e estudar, e até o sono melhorou. Uma brincadeira que deu certo.