Cresce a participação de CAC’s no crime organizado, aponta Instituto Sou da Paz

Cresce a participação de CAC’s no crime organizado, aponta Instituto Sou da Paz
Publicado em 26/08/2024 às 8:17

Um levantamento realizado pelo Instituto Sou da Paz, ao qual a CNN teve acesso com exclusividade, revela que, desde 2016, Colecionadores, Atiradores e Caçadores (CAC’s) vêm sendo cada vez mais utilizados para facilitar o acesso a armas e munições por organizações criminosas.

A pesquisa realizada pelo instituto, com base em casos públicos, aponta um aumento ainda mais acentuado entre 2022 e 2023, período que coincide com a flexibilização das regras de controle de armas promovida durante o governo Bolsonaro.

“O levantamento aponta uma situação gravíssima de uma nova fonte de migração de armas legais para o mercado criminal. O crime organizado é um dos principais problemas do país e que acabou sendo beneficiado por mais essa fonte acesso a armas”, afirma Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz.

Para o instituto, as mudanças na legislação, como a retirada de barreiras entre CAC’s iniciantes e avançados e o aumento das cotas de compra de armas e munições, facilitaram o desvio de armamentos para o crime organizado.

O documento destaca que armas como fuzis e pistolas 9mm, de grande interesse para o crime, tornaram-se mais acessíveis. Além disso, os casos de envolvimento de CAC’s com o crime organizado estão espalhados por todas as regiões do Brasil, com 19 das 27 Unidades da Federação registrando ao menos um incidente.

O estado de São Paulo lidera com 9 ocorrências, seguido pelo Espírito Santo com 7 casos e o Rio Grande do Sul com 6.

 

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Casos de repercussão nacional

Entre os casos mais graves identificados, destaca-se o de Victor Furtado Rebollal Lopes, conhecido como “Bala 40”, e sua esposa. O casal utilizou o registro de CAC para adquirir o limite máximo permitido de armamentos, comprando 26 fuzis T4 Taurus idênticos, que seriam repassados para o Comando Vermelho no Rio de Janeiro, além de 11 mil munições. Todos os itens foram adquiridos e transportados legalmente com guias de trânsito emitidas pelo Exército.

Outro caso relevante ocorreu em 2022, durante a operação Ludibrio, da Polícia Federal, que prendeu um armeiro do Primeiro Comando da Capital (PCC). O suspeito conseguiu se registrar como CAC usando certidões falsas, mesmo com 16 inquéritos ou processos judiciais em seu nome, incluindo acusações de homicídio. Entre as armas registradas em seu nome estavam um fuzil 5.56mm e uma carabina 9mm.

O caso mais recente foi divulgado em 23 de agosto de 2024, após uma operação da Força Integrada de Combate ao Crime Organizado do Espírito Santo (FICCO/ES). O suspeito, registrado como CAC no Rio de Janeiro, adquiriu mais de 60 mil munições de diversos calibres para repassar a uma facção criminosa no Complexo da Penha, no Espírito Santo.

“Esse caso, super recente, mostra que esse tipo de desvio é mais comum do que se imagina. Se houver um investimento pesado em investigação desse tipo, muito provavelmente muitos outros casos serão descobertos”, avalia Carolina Ricardo.

Atividades das Organizações Criminosas

Organizações criminosas como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), além de outros grupos menores, se beneficiam do desvio desses armamentos.

O estudo do Instituto Sou da Paz indica que esses grupos estão envolvidos em uma ampla variedade de atividades criminosas, incluindo tráfico de drogas, quadrilhas de roubo de valores e “novo cangaço”, milícias urbanas e rurais, grupos de extermínio e grilagem de terras.

Risco de Retrocesso

Apesar das medidas adotadas pelo governo Lula em julho de 2023 para restringir o acesso a armas potentes, o Projeto de Decreto Legislativo 206/2024, aprovado na Câmara e prestes a ser votado no Senado em 27 de agosto, ameaça reabrir essas brechas, facilitando ainda mais a inclusão de novas armas em coleções e a circulação dessas armas para outras atividades.

Para Carolina Ricardo, a situação é gravíssima. “O crime organizado, que já é um dos maiores problemas do país, foi beneficiado por essa nova fonte de acesso a armas legais. Cabe ao Governo Federal e ao Senado trabalharem para evitar que a legislação sobre armas seja ainda mais flexibilizada, aumentando o risco de que essas armas cheguem ao mercado criminal”, pondera.