Segundos, horas, dias… – Tribuna do Norte

Segundos, horas, dias… – Tribuna do Norte
Publicado em 02/11/2024 às 14:10

Vicente Serejo
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Quem sabe afastar, pelo menos por um instante, as boas ilusões da vida, há de saber que ao chegar ao meado dos setenta anos vem a sensação real dos dias poucos que restam e encurtam o futuro. Alguém já disse, e a memória não guardou o nome, que a velhice é boa, pena que seja tão curta. Umas são longas e lúcidas. Nem todas. Principalmente as que chegam trazendo os fracassos que a biologia não conseguiu vencer. Pode ser simplória a afirmação, mas a vida é mesmo assim.

A quem ainda duvida, basta por os olhos na origem velhíssima da ampulheta, até hoje meio desconhecida, entre os gregos e os egípcios, para ter certeza de que o tempo passa e é inexorável o ritmo dos dias e noites. O mais simbólico não é a sua forma, nem o seu vidro, invenção também muito velha, nascida não se sabe até hoje de quais mãos. O mais simbólico, quem sabe, é aquela areia que vai descendo, lentamente, pelo gargalo estreito, como se contasse segundos e minutos.

Ora, ora, se os dias vão e nós ficamos mais velhos a cada hora; e, se agora, o relógio marca um minuto a menos e não um minuto a mais, como antes; todos ficam e o tempo passa, como no poema de Apollinaire; se o tempo é doloroso, como na poesia de Manuel Bandeira, sem lembrar a angustiada busca de Marcel Proust; se para Carlos Drummond de Andrade o tempo passa, ainda que possa florir, por entre as cavernas de corações cansados, um novo amor, duvidar quem há de?

Ninguém se engane, por mais macios que possam ser os dias: o tempo passa. Sem pressa e sem demora. E o seu ritmo ninguém pode mudar. Cada um tem na vida, quando não na própria consciência, um metrônomo que no seu tic-tac vai marcando o tempo, mesmo para aqueles fortes que levam a vida como uma doce canção. E se viver faz mais medo do que morrer, tem uma razão de ser: é que os perigos moram nos dias comuns, infensos às glórias que nos enganam sem pudor.

A felicidade e a infelicidade cansam na mesma e calma hora de cada dia. Ora, se ninguém suportaria ser feliz, se não existisse a infelicidade para dosar o doce e o amargo desse desafio que é viver, como seria? E viver, entre o muito e o pouco, cada sensação a seu tempo, entre vitórias e derrotas, confessáveis ou não? Aliás, a felicidade chama o tédio, e cansa. O que pode nos salvar do pecado é acreditar no verso de Caetano Veloso: “Gente é pra brilhar, não pra morrer de fome”.

Um dia fui entrevistar Dona Teodora, já idosa. Das suas mãos enrugadas nasciam santos coloridos. Perguntei se acreditava que eram santos de verdade. Ela respondeu com a maior candura do mundo, e com aquela força das verdades que vão além, muito além da condição humana: “Não. São de madeira”. Para depois acrescentar, na sala humilde de sua casinha de taipa, em Acari, numa lição de vida: “Só são santos para quem tem fé”. Foi ali que aprendi o sentido da transcendência…

PALCO

DÚVIDA – Garibaldi Filho ainda não tem certeza da convocação da vareadora Nina Souza para o secretariado de Paulinho Freire, gerando uma convocação do sobrinho e suplente Felipe Alves.

MAS – Como dizia, ontem, um vereador de caminhos abertos no Palácio Padre Miguelinho, em compensação Garibaldi sabe: Walter é primo de Felipe e o MDB é, hoje, um partido particular.

MARIDO – Lançada no Brasil, pela Bazar do Tempo, ‘A Beleza do Marido’, de Anne Carson, o título que mereceu o Prêmio T. S. Eliot. Casson é autora do ensaio “Eros, o doce-margo”, 2023.

TANGOS – O livro de Carson é baseado na tese do poeta John Keats – a beleza é a verdade – e é construído a partir de 29 versos e inspiradores de 29 tangos em passos que vão da prosa à poesia.

MESA – Adriana Lucena, boa herdeira da sensibilidade de Jardelino e Renira, fala na próxima quinta-feira sobre a carne e o queijo na mesa sertaneja. No Instituto Histórico, a partir das 17h.

HUMOR – Às feministas de todos os ofícios, principalmente as empedernidas e mal humoradas, essa joia de Odorico Paraguaçu: “O homem que é homem não chora. Só quando come pimenta”.

POESIA – De Dante Aliguieri, entre o divino e o profano, sobre a velha ferrugem do tempo que só engana: “Vês que a razão, / seguindo o caminho indicado pelos sentimentos, tem asas curtas”.

DOR – De Nino, o filósofo melancólico do Beco da Lama, caído em desuso, olhando o riso frio e triste dos ingratos que enganam a si mesmos: “A ingratidão fere a própria mão que deu a bofetada”.

CAMARIM

XADREZ – O primeiro teste de serenidade e habilidade políticas do prefeito Paulinho Freire será a composição do seu secretariado. Terá que acomodar indicações de Álvaro Dias, José Agripino, Rogério Marinho, Styvenson Valentim e os sonhos de 24 vereadores. Só nesse primeiro apanhado.

AINDA – São duas etapas: a primeira até a sucessão estadual, pois lá estarão aqueles com os quais assumiu compromissos; e depois da sucessão, a gestão para consolidar sua imagem de gestor e não apenas, e tão só, continuador de Álvaro Dias. Até para construir as bases da sua própria reeleição.

VALOR – A Casa Mário de Andrade, SP, lançou no seu site o bico-de-pena de Mário de Andrade desenhado por Erasmo Xavier e que lhe foi dado como presente quando de sua visita a Natal, 1928. Hoje está no Instituto de Estudos Brasileiros, IEB, da USP, a quem pertence o acervo de Mário.

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